O que o Brasil pode fazer para mitigar os efeitos das políticas protecionistas dos EUA?
Por Deisi Diel Weber* Motivada pelo objetivo de fortalecer a indústria nacional estadunidense, os EUA têm adotado políticas protecionistas face aos vários países com os quais mantêm relações econômicas, aumentando […]
Por Deisi Diel Weber*
Motivada pelo objetivo de fortalecer a indústria nacional estadunidense, os EUA têm adotado políticas protecionistas face aos vários países com os quais mantêm relações econômicas, aumentando as tensões entre as grandes potências. No entanto, a interdependência econômica global torna inviável uma autossuficiência completa do país norte-americano, exigindo investimentos substanciais e tempo para internalizar uma produção altamente globalizada.
Com um expressivo número de multinacionais operando globalmente, muitas empresas investiram em outros países devido às cadeias globais de valor, com produção concentrada na Ásia. Desse modo, os EUA teriam de realocar investimentos para viabilizar a produção doméstica, movimento demorado e oneroso, que resultaria em um aumento dos custos para os consumidores internos, que passariam a pagar mais caro por produtos importados sujeitos às elevadas tarifas.
O efeito mais imediato das políticas protecionistas é uma redução no comércio entre China e Estados Unidos, diminuindo exportações chinesas para o país norte-americano e fazendo com que produtos produzidos em outros países passem a buscar novos mercados consumidores. Com isso, pode haver uma enxurrada de produtos asiáticos no Brasil: se de um lado isso pode aumentar a oferta de produtos mais baratos por aqui e diminuir a pressão inflacionária, por outro lado pode prejudicar muito as indústrias brasileiras que não estão preparadas para essa concorrência.
Essa desaceleração do comércio mundial já está sendo estimada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) que projeta um crescimento global de 2,8% para 2025, configurando uma queda em relação aos 3,3% conquistados em 2024.Um dos principais fatores que contribuem para esse panorama é a intensificação das barreiras tarifárias e a consequente incerteza gerada por essas tensões, que impactam negativamente os investimentos e a confiança dos mercados financeiros e contribuem para uma maior volatilidade econômica global.
Nessa ótica, é importante lembrar que os EUA são o segundo maior parceiro comercial do Brasil: aço e alumínio são os produtos brasileiros que, até o momento, sofrem os maiores efeitos, pois serão taxados em 25% ao entrarem nos EUA; estes produtos têm o mercado norte-americano consumindo 47% do total exportado de aço e alumínio brasileiros.
No médio prazo, a medida adotada pelos EUA pode gerar pressão inflacionária devido à tributação adicional e à necessidade de produção interna a custos mais altos do que em alguns outros países (como os de mão de obra), o que levaria ao aumento de taxas de juros e crescimento econômico mais lento.
Para países exportadores como o Brasil, as tarifas adicionais impostas pelos EUA podem representar um obstáculo ao acesso ao mercado estadunidense. Entretanto, essa mesma política tem gerado reações de outras nações afetadas, criando oportunidades para o Brasil expandir sua presença em mercados alternativos. Além disso, já há acordos sendo mediados entre Brasil e China para aumentar a exportação do agronegócio brasileiro.
A China, por exemplo, já é o maior parceiro comercial do Brasil e demandará alternativas ao fornecimento estadunidense, repetindo o cenário de 2018 com a soja e a carne. A continuidade desse cenário pode abrir espaço para o Brasil suprir a demanda crescente.
No entanto, caso os EUA reduzam suas importações da China, o crescimento chinês pode ser impactado, reduzindo a demanda global por insumos e mercadorias e isso também afetaria o Brasil. Ainda assim, a forte presença dos alimentos na exportação brasileira pode minimizar os impactos negativos dessa redução na demanda chinesa.
Diante desse contexto, o Brasil pode adotar estratégias para mitigar os efeitos da política protecionista estadunidense e fortalecer sua posição no comércio internacional:
- Diversificação de mercados: aprofundar relações comerciais com a Ásia, expandindo exportações para países como Índia, Indonésia e Vietnã; avançar na oficialização do acordo Mercosul-União Europeia; e ampliar parcerias com nações africanas e do Oriente Médio, setores que demandam alimentos, commodities e manufaturados brasileiros.
- Fortalecimento do Mercosul e integração regional: buscar maior integração produtiva com Argentina, Paraguai e Uruguai para fomentar cadeias produtivas regionais, reduzindo a dependência dos EUA e explorando acordos comerciais com países como México e Chile.
- Novos acordos comerciais: explorar parcerias bilaterais e multilaterais, como as com a Índia, Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean) e a Aliança do Pacífico, facilitando o acesso a novos mercados e reduzindo a dependência de mercados tradicionais.
- Competitividade industrial: investir na inovação e na tecnologia para agregar valor aos produtos exportados, reduzir tributação sobre insumos importados para viabilizar a produção interna com custos menores e promover uma tributação mais eficiente sobre a indústria.
- Diálogo comercial com os EUA: reforçar negociações bilaterais para mitigar barreiras comerciais em setores estratégicos, como o agronegócio, buscando manter a cooperação econômica e garantir acesso privilegiado ao mercado norte-americano.
A postura protecionista dos EUA apresenta desafios, ao passo que cria oportunidades para o Brasil consolidar sua presença no cenário global. Ao diversificar mercados, fortalecer sua indústria e ampliar acordos comerciais, o País pode minimizar impactos negativos e garantir competitividade internacional em um cenário de crescentes transformações econômicas e políticas.
*Professora mestra do curso de Comércio Exterior do Centro Universitário Cesuca.